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O que é violência obstétrica e o que fazer caso seja vítima

Sofrer algum tipo de violência obstétrica faz parte da realidade de muitas mulheres no Brasil. “Ah, vai ser só um cortezinho para facilitar a saída da criança'”; ”Pra quê sofrer e colocar seu filho em risco em trabalhos de parto que podem seguir horas a fio? Melhor fazer uma cesariana, tão prático”. Esses são alguns exemplos que você pode ter vivenciado ou possivelmente conhece alguma mãe que passou por isso. O que muitas mulheres não sabem é que, sem o consentimento delas, em muitos casos, essas práticas são desnecessárias ou até proibidas.

Levantamento Nascer no Brasil, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), de 2012, mostra que 30% das mulheres atendidas em hospitais privados sofrem violência obstétrica. No Sistema Único de Saúde (SUS), 45%. O dado, apesar de ter uma década, é o mais recente estudo divulgado sobre o tema.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), violência obstétrica é a “apropriação do corpo da mulher e dos processos reprodutivos por profissionais de saúde, na forma de um tratamento desumanizado, medicação abusiva ou patologização dos processos naturais, reduzindo a autonomia da paciente e a capacidade de tomar suas próprias decisões livremente sobre seu corpo e sua sexualidade, o que tem consequências negativas em sua qualidade de vida”.

Apesar de ser reconhecida pela OMS, não há uma lei que criminalize a violência obstétrica no Brasil. Mas, em 2017, o governo federal lançou uma série de diretrizes para humanizar o parto normal e reduzir o número de intervenções consideradas desnecessárias.

O documento foi elaborado por um grupo multidisciplinar, composto por médicos obstetras, médicos de família, clínicos gerais, neonatologista, anestesiologista e enfermeiras obstétricas.

Os tipos de violência obstétrica

A violência obstétrica pode ocorrer de várias formas. Pode ser verbal, quando é humilhada, e também pode ocorrer de forma física e/ou sexual, quando a mulher é submetida a intervenções desnecessárias ou sem consentimento.

Com as diretrizes, o Ministério da Saúde pretendia reduzir as altas taxas de intervenções desnecessárias como a episiotomia (corte no períneo), o uso de ocitocina (hormônio que acelera o parto), a cesariana mal indicada, aspiração naso-faringeana no bebê, entre outras.

Procedimentos no parto que devem ser evitados:

  • Uso do hormônio ocitocina para acelerar a saída do bebê;
  • Cesariana;
  • Técnica conhecida como “manobra de Kristeller”;
  • Uso do fórceps;
  • Lavagem intestinal antes do parto;
  • Raspagem dos pelos pubianos;
  • Rompimento da bolsa;
  • Episiotomia (corte no períneo);

”A gente sabe que a episiotomia não é para ser feita nunca. Ela não tem nenhuma evidência científica sobre ela, ela não protege o bebê, ela não favorece ou aumenta o canal de parto. A gente sabe que a episotomia podemos considerar uma mutilação genital, é uma violência e, infelizmente, acontece na prática médica diária porque são coisas que são passadas de um residente para o outro”, explicou o médico.

 

foto de perfil da barriga de uma grávida
Muitas práticas consideradas ‘comuns’ nos partos são desnecessárias ou proibidas(foto: Pixabay)

São inegáveis os benefícios dos avanços na medicina que vieram para salvar vidas de mães e bebês. Há intervenções como a cesariana que, em muitos casos, são necessárias. Questionável é o uso indiscriminado do método.

Número de cesárias no Brasil

Dados do Painel de Indicadores de Atenção Materna e Neonatal, feito pela Agência Nacional de Saúde Suplementar, mostram que dos 287.166 partos realizados por planos de saúde privados em 2019, 84,76% foram por cesariana.

Diversos fatores colaboram para que isso ocorra. Desde a falta de informação à cultura de autoridade inquestionável de profissionais da medicina.

”Você só vai saber o que pode e o que não pode se você tiver a liberdade de questionar.  Culturalmente, a gente não questiona o médico. Não questionar obstétrica fica muito pior porque você pode ser facilmente enganada e cair na cesariana em situação desnecessária”, completou o médico.

 

O que é o plano de parto?

O Plano de Parto pode ajudar a esclarecer as preferências da gestante. Trata-se de um texto, escrito pela mulher explicitando suas preferências de forma clara sobre o que gostaria e o que não gostaria que acontecesse durante o parto, pós-parto e cuidados com o bebê. Isto inclui escolher onde a mulher quer ter seu bebê, a posição que gostaria de adotar, quem vai estar presente, quais são os procedimentos médicos que a mulher aceita e quais prefere evitar, entre outros. 

O que fazer se for vítima de violência obstétrica?

Práticas consideradas abusivas podem ser penalizadas com base nos nossos códigos civil e penal ou pelo Conselho de Medicina.

“E como a gente identifica se uma violência obstétrica foi criminosa ou não? Eu vou dar alguns exemplos que podem facilitar. Quando você tenta protocolar o seu plano de parto numa maternidade e eles recusam, você está diante de uma violência obstétrica, mas não está diante de um crime. É algo que você precisa resolver na área cível”, aponta a advogada, Fernanda.

Mas um médico que faz uma cesárea que você não consentiu e não era necessária, comete um crime de lesão corporal. “Uma coisa que muita gente não sabe: qualquer cirurgia é uma lesão. Quando você faz uma cirurgia necessária, quando consegue comprovar que você precisava daquele procedimento, e você consentiu é uma lesão que é ok. Agora, o médico faz uma cesárea que você não queria, ume episiotomia que você não queria, ele comete uma lesão corporal”, finalizou.

“A gente sabe que a episotomia podemos considerar uma mutilação genital, é uma violência e, infelizmente, acontece na prática médica diária porque são coisas que são passadas de um residente para o outro”

Paulo Noronha, médico obstetra

A denúncia pode ser feita no próprio hospital, clínica ou maternidade em que a vítima foi atendida. Também é possível ligar para o disque 180 ou para 08007019656 da Agência Nacional de Saúde Suplementar para denunciar o atendimento do plano de saúde.

A vítima também pode acionar o Conselho Regional de Medicina ou o Conselho Regional de Enfermagem e até a Defensoria Pública ou Advogado particular em caso de ação judicial de reparação por danos morais e/ou materiais.

E, para apurar a existência de  crime, como lesão corporal ou homicídio, por exemplo, a vítima deve procurar a polícia ou o Ministério Público.

 

Estado de Minas

 

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